Hei de plantar e de colher


Arnaldo Niskier

O reconhecimento pelas conquistas através de grandes projetos na Educação é fato raro. Torna-se, porém, estimulante para todos aqueles que dedicam sua vida a esse campo tão repleto de desafios.
 
Depois de escrever com brilho a biografia de Chiquinha Gonzaga, a escritora Dalva Lazaroni vem agora, com grande estilo, resgatar uma das mais importantes epopeias vividas no século XX, no Estado do Rio de Janeiro. Narra fatos que tiveram repercussão nacional e até internacional.
“Mate com Angu – A história de Armanda Álvaro Alberto” (Editora Europa) é uma biografia que preenche lacuna inaceitável.
 
Armanda foi a educadora que iniciou no Brasil projetos educacionais de vanguarda, sendo precursora e contemporânea de Anísio Teixeira, Gilberto Freire, Roquette Pinto e muitos outros.
O conceito “aprender a fazer, fazendo” foi a base pedagógica da Escola Proletária de Meriti. Graciliano Ramos cita Armanda em Memória do Cárcere.
 
No mesmo ano do centenário de morte de Euclides da Cunha, a publicação desta biografia da professora Armanda ganha importância, tendo em vista ter sido iniciativa sua a criação da primeira biblioteca dedicada ao autor de Os Sertões, por isso chamada euclideana. Dalva Lazaroni mostra uma Armanda apaixonada pelas ideias de defesa dos pobres. Lutou por uma revolução pela Educação.
 
Pioneira, a Escola Proletária de Meriti foi inaugurada em 1921. Oferecia alimento de alto teor nutritivo, junto com uma educação esmerada, a alunos da escola, de maneira indiscriminada. A escola recebeu o apelido de Mate com Angu, nome usado às vezes de forma pejorativa, mas que se impôs, pela força de suas propostas. 
 
Ao manifestar suas opiniões  convergentes com o Socialismo, Armanda Álvaro Alberto acabou perseguida e presa pela polícia de Getúlio Vargas.
 
A Dalva Lazaroni devemos mais esta obra de valor literário e histórico. Repassa a História do Brasil, desde os primeiros anos da República, seguindo-se a Primeira Guerra Mundial e depois a Segunda Guerra. Foi amiga e colaboradora do jornalista Samuel Wainer, com quem se uniu no combate ao fascismo. Dalva lembra que Armanda foi também a primeira a usar o sistema educacional de Maria Montessori.
 
Este livro coloca diante de nossos olhos uma bonita vida – o registro da sua devoção às causas populares. Reparem neste fato da sua infância, que se encontra na página 49 do livro: “Certa ocasião, Armanda ganhou alguns presentes do pai: uma pá, uma enxada e um lindo regador.
 
— Que lindo, pai. Como adivinhou que era isso que eu queria?
— Olha, minha filha, esse pedaço do Brasil é seu, inteiramente seu. Faça com que produza flores, frutos e hortaliças. Lembre-se do que disse o escrivão da armada portuguesa, Pero Vaz de Caminha, quando escreveu ao rei: “a terra é de tal maneira graciosa que plantando dar-se-á nela tudo.” E você, acha que Pero Vaz de Caminha teve razão?
— Teve sim, papai, e eu hei de provar a todo o mundo que teve mesmo. Hei de plantar e de colher.”